AVALIAÇÃO DO ENSINO FUNDAMENTAL DO MUNICÍPIO DE ANGRA DOS REIS:
PISTAS PARA A CONDUÇÃO DE UM SISTEMA COMPLEXO


1. INTRODUÇÃO

Tem sido recorrente, há algum tempo, as iniciativas municipais de avaliação das redes de escolas de ensino fundamental (1a. a 8a. série) visando colher subsídios sobre o processo de ensino de cada escola, em particular, e na rede de escolas, como um todo. A idéia predominante é a de obter elementos para aprimorar o sistema municipal de educação e os desempenhos dos estudantes. A iniciativa da Secretaria Municipal de Educação (SME) de Angra dos Reis é um bom exemplo destas iniciativas. Esta Secretaria, no período compreendido entre 2002 e 2004, encarregou o Núcleo de Gestão e Avaliação (NUGA) da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) de avaliar sua rede de escolas de educação fundamental, que atende a mais de 17 mil estudantes.

Neste trabalho, que ora desenvolvemos – ainda como desdobramento do projeto de pesquisa e avaliação da rede municipal de educação básica de Angra dos Reis, voltamos ao mesmo Relatório de Avaliação do Ensino Fundamental de Angra dos Reis{1} (2004), porém, com outros objetivos.  Nosso interesse presentemente é, pois, o de discutir aspectos da condução do sistema educativo, compreendendo-o como um sistema complexo; não numa acepção vulgar, mas como Morin o conceituou levando em conta suas três faces:

  1. Sistema (que exprime a unidade complexa e o caráter fenomenal do todo, assim como o complexo das relações entre o todo e as partes);
  2. Interação (que exprime o conjunto das relações, ações e retroações que se efetuam e se tecem num sistema);
  3. Organização (que exprime o caráter constitutivo dessas interações – aquilo que forma, mantém, protege, regula, rege, regenera-se – e que dá à idéia de sistema a sua coluna vertebral) (2001:265).
Assim, a partir de tal relatório, se ficamos sabendo quais subsídios são apresentados para a tomada de decisões sobre o processo educativo em cada escola e na rede municipal de Angra de Reis e a partir de quais a Secretaria Municipal de Educação pode tomar medidas para a maior eficiência do sistema e levar os professores e estudantes a aprimorar seu desempenho, pouco, no entanto, ficamos sabendo acerca da condução do sistema educativo, dado a sua complexidade que, segundo Lesourne (1988), citado por Alain Michel (1996:6-7), apresenta as seguintes características essenciais:
  1. Objeto – transformar seres humanos infinitamente diversos e autônomos;
  2. Dimensões do sistema: 55 escolas; mais de 18 mil estudantes; 59 professores de 4a. série e 47 professores de 8a. série, dos quais 83,02% são do sexo feminino;  metade deste corpo docente tem como formação o Ensino Médio, 31% têm curso superior de graduação, 18%, alguma Especialização e, apenas, 1% tem cursos de Mestrado e Doutorado;
  3. Multiplicidade formal: organogramas, estatutos, regimentos, regulamentações, opções e diplomas;
  4. Complexidade informal: normas rígidas emanadas no Nível Central, regulamentos escolares particulares, graus diferenciados de autonomia, diversidade de estabelecimentos e de responsáveis;
  5. Paradoxo de relações: o sistema educativo, por suas próprias características, tende a fechar-se sobre si mesmo ao mesmo tempo em que se abre, em grande medida, ao conjunto da sociedade;
  6. Efeitos do sistema educativo de educação básica abrangem grandes períodos: o tempo educacional é um tempo largo, de dezessete anos, a começar da Educação Infantil, e há que levar em consideração tal duração;
  7. Peso das limitações econômicas e exigência de eficácia: difíceis de serem definidos e medidos no campo da educação;
  8. Dificuldade de medir seus efeitos: além de dificuldades conceituais, há ainda que distinguir o que depende da atividade educativa e o que depende dos seus resultados;
  9. Multiplicidade e imprecisão do conjunto de objetivos do sistema educativo;
  10. Necessidade de superar a posições simplistas ou maniqueístas;
  11. Necessidade de ter em conta que a educação é um lugar de conflitos: são múltiplos os interesses e os atores educacionais.  

Nosso objetivo primordial no presente trabalho é, portanto, a de nos determos em alguns aspectos do Relatório tentando encontrar pistas relativas à condução de um sistema educativo de tamanho considerável, considerando, sobremaneira, sua complexidade e os atributos que a caracterizam. Especificamente, pretendemos, nos guiar por algumas questões que consideramos fundamentais: a condução deste sistema é centralizada? É compartilhada? Apresenta dispositivos de acompanhamento da realização dos objetivos? Todos trabalham para estabelecer a coerência finalista do sistema educativo? Com o levantamento de tais pistas, a partir do que expressam os seus atores no Relatório, nosso desejo é o de contribuir para sua condução mais eficaz, argumentando, porém, serem importantes, mas insuficientes os levantamentos estatísticos, as avaliações pontuais e de larga escala, bem como as simples previsões e projeções.

2. SÍNTESE DO RELATÓRIO: PERSPECTIVAS E DESAFIOS

O projeto de avaliação foi iniciado em setembro de 2002 e encerrado em dezembro de 2004, utilizando metodologia quantitativa, incluindo instrumentos de coleta de dados no formato de questionários, testes de desempenho escolar e entrevistas com diversos atores. Seu universo abrangeu todas as escolas da rede de ensino de Angra dos Reis, diretores, professores de Matemática e de Língua Portuguesa e alunos de 4ª e 8ª séries do ensino básico.

A apresentação do Relatório de Avaliação (2004) foi organizada em três partes. Na primeira, foram analisadas as informações coletadas a partir das entrevistas com os diretores; na segunda, os resultados das entrevistas com os professores de Língua Portuguesa e Matemática de 4ª e 8ª séries e, finalmente, na terceira e última os resultados dos testes de desempenho escolar aplicados aos alunos.

Cada uma das suas partes mereceria um artigo ou uma publicação de maior fôlego. Nosso exíguo espaço, no entanto, nos leva a atentar para os nossos objetivos, infelizmente abandonando a sua última parte, exatamente a que trata dos desempenhos estudantis. Assim, examinando apenas as duas primeiras partes, vamos tentar desvelar os desafios ou os conflitos de poder que emperram a condução de um sistema complexo com vistas ao seu movimento com coerência em direção aos seus fins.   

2.1. O que disseram os Diretores

Foram entrevistados 43 diretores que atendem ao ensino fundamental. A diferença numérica entre o total de diretores e o número de escolas se deve a uma situação peculiar do Município, que na ocasião da pesquisa tinha 12 escolas multisseriadas, tendo cada duas escolas um só diretor. Estas escolas eram em áreas rurais ou em uma das muitas ilhas que compõem o território municipal.
Das respostas que deram, fica claro, em síntese, que são eles que:

  1. Lideram os processos de elaboração do projeto pedagógico da unidade escolar, avaliação do desempenho dos alunos e relacionamento com os pais e  professores;
  2. Destacam, com o objetivo de melhorar o desempenho da escola, os conselhos de classe e as reuniões pedagógicas, as atividades de recuperação para os alunos e a intensificação das relações com os pais dos alunos;
  3. Apontam, como principais obstáculos na área pedagógica, a pouca informação dos pais, a dificuldade na implementação do projeto pedagógico e a deficiência de material didático para todos os alunos;
  4. Enunciam, como principais obstáculos na área administrativa: a manutenção das instalações, a autonomia financeira insuficiente e o relacionamento com alguns professores e funcionários;
  5. Indicam necessidade de trabalhar melhor o projeto político-pedagógico da escola e de melhorar a formação dos professores como condição para a melhoria da qualidade do ensino;
  6. Afirmam não ter autonomia de decisões em relação a mudanças curriculares, alterações no calendário escolar, indicação de professores e de pessoal técnico-administrativo, transferências de professores e compra de material de consumo, e modificação na forma de avaliação do ensino;
  7. Consideram não ter autonomia para indicar à Secretaria de Educação quais cursos seriam necessários para qualificar melhor os  professores;
  8. Sentem-se com autonomia para decidir sobre normas, procedimentos, rotinas da escola,  liberação de professores para fazerem cursos de atualização e para melhorar os resultados da avaliação dos alunos;
  9. Elogiam o fornecimento de livro didático e a oferta de cursos para capacitação de professores e supervisores pedagógicos das escolas;
  10. Criticam a insuficiência de recursos para a manutenção das escolas.


2.2. Os professores também falaram

A amostra estudada foi composta de 106 professores, sendo 59 de 4ª série e 47 de 8ª série (25 de Língua Portuguesa e 22 de Matemática), dos quais 83% do sexo feminino.

Para a construção do perfil pedagógico destes professores, elaboramos um instrumento de coleta de dados que contemplava alguns aspectos: o que pensam sobre o planejamento de ensino; a didática utilizada por eles; e a avaliação da aprendizagem realizada.

A partir dos dados coletados, é possível afirmar, também em síntese, que tais professores:

  1. Valorizam mais o Projeto Político-Pedagógico da escola do que o planejamento do ensino, embora não tenham clareza do que seja este projeto e de como ele se diferencia das demais formas de planejamento elaboradas na instituição escolar;
  2. Elaboram o currículo da escola;
  3. Planejam suas aulas, a partir das trocas de experiências com os colegas, mais do que do apoio da equipe técnico - pedagógica da escola ou da SME;
  4. Consideram aspectos mais importantes do planejamento, os seus objetivos e a avaliação;
  5. Enfatizam pouco os procedimentos de ensino; e preferem, em maior escala, as aulas tradicionais e as aulas expositivas dialogadas;
  6. Desconsideram os livros didáticos na preparação das aulas ou como meio de instrução;
  7. Não consideram que a disciplina em sala de aula seja condição essencial para a aprendizagem dos alunos;
  8. Preferem exercícios para serem feitos em casa como forma de reforço da aprendizagem;
  9. Atribuem às deficiências de aprendizagem, a falta do conteúdo anteriormente lecionado;
  10. A maioria avalia semanalmente os seus alunos individualmente, elaborando avaliações formativas (voltadas para orientar e corrigir o ritmo ou o procedimento de ensino, ao longo do período), sem finalidades de mensuração e classificação. Têm experiência no magistério, e são bastante "abertos" à discussão dos aspectos pedagógicos e à formação contínua;
  11. Valorizam o planejamento de ensino, principalmente no que concerne à formulação de objetivos e à avaliação embora deixem de ter muita clareza de certos conceitos;
  12. Destacam a avaliação formativa e constante, realizada semanalmente em sala de aula, e o oferecimento de reforço aos alunos que apresentam dificuldades de aprendizagem (ainda que sob a forma de exercícios feitos em casa).

 

3. INFERÊNCIAS SOBRE O QUE DISSERAM OS DIRETORES E PROFESSORES

As “falas” dos Diretores e Professores, a despeito de qualquer adjetivação, demonstram esforços feitos no âmbito das unidades escolares em prol da melhoria da estrutura física, dos processos pedagógicos, das relações com a comunidade escolar etc.

Os Diretores, entretanto, reiteram lamúrias crônicas —recorrentes em outros sistemas educativos— referentes às dificuldades de implementar projetos, universalizar materiais didáticos, obter recursos e, em especial, quanto à restrição de suas autonomias em assuntos importantes com impacto sobre a qualidade da educação a oferecer. Reconhecem ainda somente ter autonomia no que tange aos aspectos da condução da unidade escolar, quando, então, são reduzidos à condição de simples gerentes de alguns procedimentos peculiares da rotina do dia a dia; no mais predomina a mais absoluta heteronomia proveniente do nível central do sistema.

Os professores, por sua vez, no estrito espaço das suas salas de aula aparecem como possuidores de mais autonomia. São eles que planejam suas aulas, determinam seus objetivos e métodos de avaliar com um certo desprezo pelos livros didáticos distribuídos pela SME (obviamente não por simples descaso), e recorrem às trocas de experiências entre pares ao invés de terem apoio, nem sempre disponível, da equipe técnico-pedagógica da escola ou da SME.

Fica claro, nestas “falas”, a existência de forte clivagem entre os segmentos aqui considerados, sobressaindo a existência de uma administração centralizada que, para agravar, deixa de trabalhar com coerência finalista, desconsiderando decisões e ações dos atores nas diversas instâncias do sistema. É como se a condução do sistema deixasse de considerar as relações de poder dentro e fora das escolas, nas comunidades, sindicatos etc. Zibas (2002:71-92), a esse respeito, ao examinar a eleição de diretores nos sistemas públicos de educação, já nos disse que os diretores e suas eleições têm componentes políticos de relevância para a sustentabilidade de reformas e programas pretendidos pelo Poder Público. Os agentes escolares, então, segundo diz, podem, por exemplo, reler as diretrizes oficiais e dar-lhes outros sentidos e direções, assim como resistir ativamente a elas ou, simplesmente, praticarem formas de conformismo ativo.

Procedendo desta maneira, é possível afirmar que a condução do sistema educativo, como nos diz Michel (1996), parece, de fato, “desconhecer sua trajetória, seu consumo de recursos e sua velocidade”. Falta-lhe “meios de previsão, uma atitude prospectiva que considere as tendências mais fortes, os riscos de desvios ou de ruptura” (idem). Mais enfaticamente ainda, acrescenta que “para favorecer as iniciativas e as inovações, em um sistema educativo mais fragmentado qualquer planificação autoritária ou regulação hierárquica, tende a converter-se progressivamente em algo inadaptado ou inclusive anacrônico”.   

Morin (2001), neste caso, parece estar com razão: não costumamos pensar senão por meio de reduções mutilantes. Não desenvolvemos ainda a ambição da complexidade. Continuamos a pensar menosprezando as articulações existentes num sistema educativo, como se seu funcionamento obedecesse a leis naturais e que sua complexidade se apresentasse como inimiga da ordem e da clareza. Nesta linha de pensamento mutilante, nós temos ainda a propensão de não admitir a escola como uma unidade que se auto-organiza, “não só a partir de um centro de comando-decisão (Estado, governo), mas também de diversos centros de organização (autoridades estaduais, municipais, empresas, partidos políticos etc.) e de interações espontâneas entre grupos de indivíduos” (Morin, 2001:180-181).

A complexidade é difícil, portanto; e a resolução dos problemas que apresenta não se reduz a fórmulas, programas e determinadas chaves, ensina-nos Morin (2001). Em seu ponto de vista, ela atrai a estratégia. “Só a estratégia permite avançar no incerto e no aleatório”. Ela, diz-nos o autor, “é a arte de utilizar as informações que aparecem na ação, de integrá-las, de formular esquemas de ação e estar apto para reunir o máximo de certezas para enfrentar a incerteza” (p. 192).

4. PISTAS PARA CONDUZIR UM SISTEMA EDUCATIVO COMPLEXO

As “falas” dos diretores e professores evidenciam que a condução do sistema educativo de Angra dos Reis é centralizada, sem dispositivos claros de acompanhamento da realização da melhoria da qualidade, e com mais dispersão do que com esforços bem definidos no sentido de uma coerência finalista das propostas de transformação. Assim, a questão crucial que se apresenta é: como enfrentar a situação e superá-la?

Morin aconselha-nos a enfrentar o desafio da complexidade oferecendo-nos algumas pistas, que concordamos serem fundamentais para a condução do sistema educativo.

A primeira é ter como ponto de partida a elaboração de pensamento multidimensional que “integre e desenvolva formalização e quantificação, mas que não se restrinja a isso” (Morin, 2001:189). Na perspectiva do autor, é preciso pensar o real apreciando suas várias dimensões. No nosso caso, seu ensinamento leva a pensar o sistema em suas dimensões constitutivas (nível central, nível intermediário, unidades escolares, atores etc) sem, entretanto, isolá-las ou torná-las não - comunicantes. 

Para tal elaboração, ele propõe duas outras pistas: o uso da dialógica e o uso da estratégia, que nós consideramos igualmente importantes à anterior. Com o uso da dialógica, Morin nos leva a admitir que “racionalidade e empirismo mantêm um diálogo fecundo entre a vontade da razão de se apoderar de todo o real e a resistência do real à razão” (p 196). Há que acolher a idéia de não contradição entre os níveis do sistema educativo, unidades escolares e seus diversos atores. Os princípios de um e outros, afinal, não são excludentes. Suas lógicas de funcionamento estão unidas; as dimensões existentes não se perdem na unidade do sistema.

Quando nos incita a pensar em estratégias, Morin (2001) nos dá a terceira pista, ensinando-nos a fazer uso das informações que aparecem na ação, de modo integrado, e de esquemas de ação, tornando-nos aptos a reunir o máximo de certezas para enfrentar as incertezas. Michel (1996) também nos indica esta mesma pista em seu estudo. Diz ele: “dirigir o sistema educativo exige, em primeiro lugar, dispor de informações básicas sobre a atividade do sistema, sobre os alunos, sobre os atores e as escolas”. E acrescenta: as informações devem estar expressas em idioma comum, que lhes permita serem confiáveis, significativas, agregáveis, comparáveis e que circulem com rapidez em sentido vertical, ascendente e descendente, e horizontal, como condição de superação dos sistemas de informação pesados, lentos e fechados sobre si mesmos.  

Vale, aqui, chamar atenção para o que Gama (2002:85) já examinou a respeito de dadas continuidades nos processos avaliativos escolares. Evitar envolver os professores – “sujeitos do conhecimento, possuidores de saberes específicos, que tanto aplicam conhecimentos produzidos por outros, como produzem, transformam e mobilizam saberes próprios” -  e submetê-los a missões elaboradas alhures, sem que as tenham discutido, obtêm-se, como contrapartida, proporcional desdém aos mecanismos de decisão e às estruturas de poder que regem a vida escolar.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste texto chamamos atenção para a condução de sistemas educativos considerando-os como sistemas complexos, insistindo para que se faça uso do pensamento multidimensional, da dialógica, das estratégias e da comunicação rápida e fiável entre as suas partes constitutivas. Todavia, duas outras considerações, se impõem como imprescindíveis e essenciais.

A primeira, diz respeito à necessidade de transformar os sistemas educativos em eficientes sistemas de educação contra a internalizarão historicamente prevalecente da lógica do capital que a tudo submete aos seus interesses de reprodução. Como Mészáros (2005, p. 49) nos ensina, precisamos nos contrapor à educação como atividade intelectual a serviço daquela internalização uma vez que ela exclui “a esmagadora maioria da humanidade do âmbito da ação como sujeitos, e condena-os, para sempre, a serem apenas considerados como objetos (e manipulados no mesmo sentido), em nome da suposta superioridade da elite: “meritocrática, “tecnocrática, “empresarial”, ou o que quer que seja”. Assim, nossa tarefa, como educadores, nos coloca, portanto, diante da necessidade essencial e urgente de nos voltarmos para as abordagens educacionais que adotem “a totalidade das práticas político-educacional-culturais, na mais ampla concepção do que seja uma transformação emancipadora” (Mészáros, 2005:57).

A segunda nos leva à necessidade igualmente urgente e essencial de pensarmos os sistermas educativos, quando sabemos que muitos deles são”pensados e reestruturados sob o modelo de certos padrões produtivistas e empresariais” (Gentili, 1996:28). Eles, quando funcionam desta maneira, tendem a reagir com eficiência aos estímulos do mercado para produzir indivíduos com as competências e habilidades requeridas imediatamente pela nova sociedade do saber e, ao mesmo tempo, ainda criam hierarquias, em diferentes instâncias, distinguindo aqueles que concebem daqueles que executam a prática pedagógica. Os diretores de escolas, por sua vez, ficam reduzidos a simples gerentes de unidade escolares e os professores, a meros cumpridores de tarefas, dependentes de especialistas e desvalorizadores dos próprios conhecimentos. Assim, como Apple (1993:123) já nos ensinou, corremos o risco de somente ter profissionais “alienados executores de planos elaborados por outros”.

Os desafios que se nos apresentam são, portanto, muitos e difíceis, e precisam ser enfrentados sem esmorecimento. Nestes momentos, o Mestre Paulo Freire (1996, p. 163) há de nos inspirar, particularmente quando nos lembra que lidamos com gente e que, por isso mesmo, “independente do discurso ideológico negador dos sonhos e das utopias, com os sonhos, as esperanças tímidas, às vezes, mas às vezes, fortes, dos educandos”. Para encerrar, o autor ainda fala: “se não posso, de um lado, estimular os sonhos possíveis, não devo de outro, negar a quem sonha o direito de sonhar. Lido com gente e não com coisas”.


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{1} Esta pesquisa contou com os seguintes professores-pesquisadores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro: Alberto de Mello e Souza, Bertha de Borja Reis do Valle, Eloiza da Silva Gomes de Oliveira, Marly de Abreu Costa e Narcisa Maria Gonçalves dos Santos.