O USO DE INDICADORES SENTINELA NA GESTÃO DE SISTEMAS EDUCACIONAIS


1. INTRODUÇÃO

O que de mais perigoso pode fazer o mundo de hoje é
prosseguir na política, como de costume
.
Karl Deutsch

A gestão de sistemas educacionais tem-se demonstrado um exercício de grande complexidade. Sob todos os ângulos que se possa observar, o sistema educacional brasileiro apresenta interessantes aspectos: é grande e, ao mesmo tempo, é formado por inúmeros sub-sistemas (municipais); envolve três esferas com funções e obrigações definidas mas interdependentes pois que oferecem um continuum; possui particularidades em grande número no que se refere à clientela: bebês, crianças, jovens, adultos, índios, negros, portadores de necessidades especiais, habitantes da zona rural, trabalhadores etc; possui igualmente um sem número de níveis e modalidades: educação infantil, ensino fundamental, ensino médio, graduação, cursos seqüenciais (curta e longa durações), tecnólogos, especializações, mestrados (acadêmico e profissional), doutorado, extensão, educação de jovens e adultos, educação profissional (com diversos cursos), educação especial, educação indígena... sem esquecer que estes tipos podem sofrer combinações variadas nas escolas; possui órgãos normativos de sistemas educacionais nos três entes federativos; possui um corpo qualificado e ativo de profissionais que atuam de forma efetiva na busca de direitos; possui sempre uma comunidade à sua volta e, em geral, uma família vinculada a cada aluno com suas expectativas de futuro e entendimento sobre o passado que quer ver reproduzido nas gerações contemporâneas. A gestão de sistemas educacionais é o que se chama em Direito um hard case (caso difícil), considerando sua complexidade.

Se isso já não bastasse, a Educação é uma “arena política” de difícil solução causado pela reunião de profissionais oriundos das mais diversas áreas do conhecimento, com saberes e valores formados em escolas de pensamento das mais diversas, o que acarreta diferentes modelos de homem, de mundo e de sociedade. Essa “Torre de Babel” é entregue a um Diretor, em geral escolhido pelos seus pares, na mais das vezes, por ser um ótimo docente.

É certamente um rico universo de tensões decisórias, arranjos de forças variadas e uma arena de conflitos dos mais diversos a todo tempo! Definitivamente, é um hard case!

Para o que se pretende neste trabalho, gostaríamos de elencar algumas variáveis que marcam de forma importante este universo educacional, sem menosprezar outras tantas: o perfil do gestor (Jassanoff, 1995; Bazzo et al, 2003), o tempo e a perícia de seus dirigentes (Matus, 2000) e a regra de formação da organização (Fukuyama, 2005).

1.1. O perfil do gestor

Sheila Jasanoff (1995), em seu artigo Procedural Choices in Regulatory Science, sustenta que há diferenças bem marcadas entre o que chamou de ciência acadêmica e de ciência reguladora.

Na ação acadêmica, os especialistas revisam e avaliam o estado do conhecimento científico, identificam áreas de consenso sobre o assunto em discussão e buscam solucionar os problemas de evidência incerta de acordo com as leis vigentes. A ação acadêmica, sem implicações políticas, desenvolve-se  em um ambiente de consenso teórico e prático, evitando a participação do público e dos demais grupos de interesse.

Na ação reguladora, que proporciona as bases para a ação política, existe uma atividade com fortes pressões pela falta de acordo, há escassez de conhecimento específico e prevalecem pressões temporais. A ação regulatória move-se “melhor no terreno do dissenso, não somente por problemas epistemológicos e metodológicos, mas também pela falta de acordo entre os próprios especialistas, com a pressão e controvérsia social que isso gera” (Bazzo et al, 2003:29).

Diz ainda, Bazzo et al. (2003) que a “ciência reguladora se move em um contexto onde os fatos são incertos, os paradigmas teóricos estão pouco desenvolvidos, os métodos de estudos são bastante inconsistentes e muito discutidos, e onde os resultados estão submetidos a consideráveis incertezas”. 

A educação, se por um lado produz conhecimento e forma pesquisadores (ação acadêmica), está com seus destinos nas mãos de políticos de oportunidade que ocupam as secretarias de educação de tempos em tempos ou a gestores de sistema que não foram efetivamente preparados —nem por formação, nem por experiência— para a função, visto que sua legitimação se dá, geralmente, pela competência docente ou pela construção da liderança corporativa. O sistema educacional será conduzido por representante de uma das duas correntes, cujas características são apontadas a seguir:

Tabela 1. Características da Ciência acadêmica e da Ciência reguladora

 

Ciência acadêmica

Ciência reguladora

Metas

“Verdades” originais e Significativas

“Verdades” relevantes para formulação de políticas

Instituições

Universidades, organismos públicos de investigação

Agências governamentais, indústrias

Produtos

Artigos científicos

Relatórios e análises de dados, que geralmente não se publicam

Incentivos

Reconhecimento profissional

Conformidade com os requisitos legais

Prazos
temporais

Flexibilidade

Prazos regulamentados, pressões institucionais

Opções

Aceitar a evidência
Rechaçar a evidência
Esperar por mais ou melhores dados

Aceitar a evidência
Rechaçar a evidência

Instituições de controle

Pares profissionais

Instituições legisladoras
Tribunais
Meios de comunicação

Procedimentos

Revisão por pares, formal ou informal

Auditorias
Revisão reguladora profissional
Revisão judicial
Vigilância legislativa

Padrões

Ausência de fraude e falsidade
Conformidade com os métodos aceitos pelos pares
Significado estatístico

Ausência de fraude e falsidade
Conformidade com os protocolos aprovados e com as diretrizes da agência institucional
Provas legais de suficiência (isto é, evidência substancial, preponderância da evidência)

É possível observar que as características são absolutamente distintas acarretando processos decisórios também absolutamente distintos que se efetivam em “tempos” institucionais diferenciados. Isso faz com que o gestor (ação reguladora) tenha que tomar decisão na busca de seu produto em tempo muito reduzido e sob forte pressão, visto que para tudo a burocracia tem um prazo. Quanto mais rápido o gestor consiga enxergar os problemas, mais tempo terá para planejar a ação necessária.

1.2. O tempo e a perícia dos dirigentes

O tempo do cidadão comum possui 24 horas como referência ou padrão. Para os governantes a unidade de tempo é medida pelo tempo do mandato e, por analogia, para os gestores públicos é medido pelo tempo de seu exercício de liderança.

Para o gestor, o tempo é um período fixo e breve que pode ameaçar sua capacidade de alcançar as metas pretendidas. O tempo é o primeiro sinal de que ascender à posição de Diretor é uma coisa, já o dirigir é um problema quantitativamente e qualitativamente diferente, exigindo competências específicas (Matus, 2000). 

Tudo tem que ser feito no curto espaço de tempo e é nessa pressão por resultados que o gestor percebe uma perversa relação: seu tempo real de ação refletida sobre a máquina pública começa a contar quando ele adquiri a perícia capaz de subjugar a máquina pública à sua vontade. Quanto mais tempo leve para aprender as competências de condução da máquina, menos tempo terá para realizar suas metas. Certamente haverá gestores que iniciam suas ações refletidas no mesmo momento que assumem o cargo. Mas é certo que haverá gestores que chegam ao final de seus mandatos sem nunca terem aprendido a submeter a máquina à sua vontade e, talvez, nunca tenham percebido o real motivo de tal ineficiência. A inexistência de responsabilização dos gestores pela ineficácia e ineficiência do sistema educacional e da escola, faz perpetuar a falta de perícia entre os gestores. Eis uma tradição que esperamos sofra mudanças brevemente quando o estado deixar a sua clássica figura de Estado Paternalista e se transforme no tão sonhado Estado de Serviço.

A falta dessa conclamada perícia é importante pois que o calendário escolar impõe restrições bastante sérias à boa vontade dos dirigentes. Ano letivo iniciado é restrição para inúmeras alterações de percurso. Em alguns casos, situações existentes em alguns cursos devem persistir até o final deste sob pena de os alunos exigirem “terminar conforme começaram”!

Mais uma vez, a capacidade de dirigir a máquina de acordo com sua vontade – perícia – é algo que precisa ser perseguido pelo gestor a fim de que possa realizar o que deseja no tempo que dispõe.

Se conseguir aliar esta perícia à capacidade de antecipar problemas, alcançará resultados satisfatórios no tempo que dispõe fazendo com que a organização escolar ou o sistema educacional se desenvolvam e alcancem bons resultados.

1.3. A formação da organização escolar

Escrevemos anteriormente sobre a complexidade da gestão do sistema educacional e descrevemos de forma livre algumas das muitas variáveis desse sistema. Mas afinal, o que é sistema? Essa pergunta foi brilhantemente respondida por Saviani (1996): “sistema é a unidade de vários elementos intencionalmente reunidos de modo a formar um conjunto coerente e operante” (p.80).

Não se deve confundir sistema (coerente e intencional) com estrutura pois que esta última é destituída de intencionalidade. Além do que “o sistema implica uma ordem que o homem impõem à realidade. Entenda-se, porém, não se trata de criar a realidade” (Saviani, 1996:82).

Parece ficar claro que o sistema não cria a realidade em que se insere. Ele busca, na verdade, movimentar a realidade na direção e velocidade desejadas.

O sistema cumprirá seu papel quanto mais competente for o gestor e quanto mais perícia possua na arte da gestão escolar.

Neste caso, devemos ampliar a discussão e lembrar que o sistema escolar é composto de vários níveis —ou unidades do sistema— que se conectam em uma declarada rede de hierarquia e dependência, girando em torno das decisões do gestor principal. Surgem, então, problemas pertinentes ao processo decisório típico de organizações deste modelo. Conforme aponta Fukuyama (2005) há uma ambigüidade porque não existem maneiras teoricamente ideais de especificar direitos de decisão em uma organização. “Tudo depende do contexto, da história passada, da identidade dos participantes da organização e de uma série de variáveis independentes” (p.104).

Em outras palavras, o sistema educacional sofre com a dificuldade de possuir uma intencionalidade que depende não só da vontade de seu principal dirigente mas da capacidade de realizar dos gestores das unidades do sistema, da aquiescência pelos gestores da intencionalidade apresentada pelo gestor principal e pela capacidade de o gestor principal delegar ao demais gestores de unidade poderes de fazer e realizar, quando a tendência para aumentar a eficácia é controlar e centralizar cada vez mais para que não se perca nem o tempo nem o foco. O gestor principal deve conviver com a necessidade de decidir na central de decisão, mas sem perder de vista o fato de que deve desenvolver, na sua equipe, a capacidade de usar conhecimentos locais para desenvolver soluções locais coerentes com a intencionalidade que se deseja dar ao sistema como um todo.

Em síntese, temos que o sistema educacional é de gestão complexa por conta de seus múltiplos atores, de suas variáveis independentes, pela ação limitadora do tempo que permite realizar ações, do mandato dos dirigentes e da perícia de cada um dos gestores para submeter a máquina à sua vontade.

Para enfrentar todas essas realidades, propomos o uso de indicadores educacionais que permitem acompanhar o desenvolvimento de itens tidos como importantes no desempenho educacional e escolar, visto que “que os responsáveis pelas políticas públicas vêm apontando a necessidade do estabelecimento de indicadores diversos” (Reali, 2001:80).

2. INDICADORES

Para Barro (s/d), indicadores servem especialmente para comparações (locais, regionais, nacionais e internacionais) e são produzidos a partir de estatística com determinados fins. Um mesmo banco de dados pode produzir diferentes e inovadores indicadores, tais como indicadores financeiros e não financeiros (PIB, matrícula, relação professor/aluno), indicadores de gastos (agregados, gastos por níveis, de disparidade de gastos, de tendências de gastos etc). Salienta, ainda, a dificuldade de realizar comparações internacionais de índices por conta dos valores e prioridades distintas e prevendo que tais dificuldade se reproduzem na tentativa de se obter indicadores consensuais para regiões e locais diferentes.

Segundo Werner e Souder (1997), os indicadores podem ser Macro, quando tratam de toda a sociedade, ou Micro, quando se reportam apenas à empresa.
Lashway (2001) escreve que “um indicador é qualquer dado estatístico que ilumina a compreensão das condições e do desempenho dos colégios”.

Para o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG, 2000), como indicadores, entenderemos os:

dados ou informações numéricas que representam e quantificam um determinado fenômeno ou as entradas (recurso ou insumos), saída (serviços/produtos) e o desempenho de processos, serviços/produtos e da organização como um todo. Podem ser simples (decorrentes de uma única medição) ou compostos e diretos ou indiretos em relação à característica medida, bem como específicos (atividades ou processos específicos) ou globais (resultados pretendidos pela organização). (p.149)

Para nós, indicador será toda informação capaz de demarcar uma posição temporal, espacial e correlacional de uma determinada variável ou conjunto de variáveis com vista a orientar uma decisão.

Atualmente, fala-se muito nos indicadores utilizados por organismos internacionais com a finalidade de comparar situação entre os diversos países. O IDH - Índice de Desenvolvimento Humano{1} avalia o desenvolvimento de 174 países, segundo três dimensões básicas e seus instrumentos de captação (indicadores):

Tabela 2.

Dimensões Básicas

Indicador

Uma vida longa e saudável

Esperança de vida ao nascer (longevidade)

O acesso ao conhecimento

Taxa de alfabetização de adulto e taxa de matrícula em todos os níveis de ensino

Um padrão de vida decente

Produto Interno Bruto (PIB) real per capita, ajustado pela paridade do poder de compra (renda)

O Brasil tem avançado, mesmo que lentamente, ao longo dos anos em que o IDH é calculado. Em 26 anos de pesquisa (1975/2001), o Brasil avançou 16 posições no ranking, sendo somente igualado pela Malásia em tal feito. Veja a evolução brasileira:

Ano

1975

1980

1985

1990

1995

2000

2001

IDH

0,643

0,678

0,691

0,712

0,738

0,772

0,777

O cálculo do IDH brasileiro desde 1970 até 1996 —para o universo de municípios brasileiros— permitiu a identificação e avaliação de modificações interessantes no perfil do Brasil e a constatação de dificuldades que se mantém, orientando de forma mais madura e profissional a definição de programas de ação e projetos que visem superar as dificuldades indicadas como persistentes.

Essa experiência evoluiu para o cálculo pioneiro do Índice de Condições de Vida, composto por 20 indicadores agrupados em cinco dimensões, demonstrando que os indicadores podem ser de diversas ordens e de origens distintas, permitindo a correlação mais adequada para o fim que se deseja alcançar ou o processo que se busca acompanhar. Neste exemplo, fica claro que a identificação do indicador, seu agrupamento em dimensões ou mesmo o peso que se dá a cada um deles não é um procedimento neutro. Ao contrário, ele traz consigo um conjunto de valores. Essas situações podem ser percebidas a partir do quadro abaixo (p.74):

Tabela 3.  Índice  de Condições de Vida

Dimensões

Indicadores relacionados

Renda

Renda familiar per capita média

Grau de desigualdade

Porcentagem de pessoas com renda insuficiente  (Po)

Insuficiência média de renda (Hiato de renda médio - P1)

Grau de desigualdade na população com renda insuficiente (Hiato de renda quadrático médio – P2)

Educação

Taxa de analfabetismo

Número médio de anos de estudo

Porcentagem da população com menos de oito anos de estudo

Porcentagem da população com mais de 11 anos de estudo

Infância

Porcentagem de crianças que trabalham

Porcentagem de crianças que não freqüentam a escola

Defasagem escolar média

Porcentagem de crianças com mais de um ano de defasagem escolar

Habitação

Porcentagem da população que vive em domicílios com densidade média acima de duas pessoas por dormitório

Porcentagem da população que vive em domicílios duráveis

Porcentagem da população que vive em domicílios com abastecimento adequado de água

Porcentagem da população que vive em domicílios com instalações adequadas de esgoto

Longevidade

Esperança de vida ao nascer

Taxa de mortalidade infantil

O governo do Ceará estuda a criação de um Índice de Inclusão Social, também derivado do IDH, e que será comporto pelos indicadores do IDH mais os dados sobre emprego, qualidade da infra-estrutura e das habitações, segurança pública e participação social.

A discussão sobre indicadores e, principalmente, como eles são compostos ou que relação produz o indicador, evita situações comprometedoras para o processo de planejamento de Políticas Públicas que chamaremos de transparentes. O número de pobres no Brasil é um triste exemplo. Parece não haver dúvida quanto a existência dos pobres brasileiros. Mas quantos são? Para a oposição, o número tenderá sempre a ser maior do que aquele defendido pelo governo. Mas o problema parece persistir pois, recentemente, tivemos essa dificuldade entre os membros do governo atual{2}: O então Ministro José Dirceu, que em dezembro de 2002 afirmava a existência de 40 milhões de pobres no Brasil, em junho de 2003 disse que eram 25 milhões. No mesmo período, o Secretário-executivo do Ministério da Assistência e Promoção Social, Ricardo Henriques, informa que são 55 milhões de pobres e 22 milhões de miseráveis. O Presidente Lula, em Davos, no Fórum Econômico Mundial, em janeiro de 2003, disse que eram 45 milhões de brasileiros abaixo da linha da pobreza. Já a cartilha do Programa Fome Zero informa que são 46 milhões. O fato é que o critério de cálculo do número de pobres é distinto para cada organismo de governo. É fato também que a formulação de Políticas Públicas não pode estar sujeita a diferença tão absurda no número de pessoas a serem atendidas, como no caso da pobreza brasileira: 55 milhões, no máximo, e 25 milhões, no mínimo, de pobres... quem se arrisca a formular uma política com essa margem de erro?

Talvez este problema se resolva com algumas reuniões internas e ajuste de discurso, na busca de consenso mínimo, indispensável e esperável em um governo. Mas, como isso está no universo gasoso da política, podemos lançar mão de indicadores que sejam compostos utilizando as dimensões que se tomam como prioritárias para identificar especificidades (grupos, sub-grupos, carências, ausências, comportamentos específicos etc) no conjunto sobre o qual recairá uma decisão. Um exemplo concreto se dá quando o formulador de políticas deseja conhecer melhor o grupo de “pobres” que vai ser atendido por políticas sociais, a fim de melhor planejar e otimizar o tempo e os recursos. Os indicadores, em geral, são globais e genéricos, como a renda per capita, para uma classe social onde o trabalho informal é regra e não exceção. Tal problema de identificação pode ser melhor trabalhado a partir do Índice de Desenvolvimento Familiar (IDF), que é um indicador sintético, que varia entre 0 e 1, composto por seis dimensões: vulnerabilidade, acesso a conhecimento, acesso a trabalho, disponibilidade de recursos, desenvolvimento infantil e condições habitacionais. Percebe-se que este tipo de indicador é voltado ao diagnóstico de grandes grupos e seus sub-grupos e indispensável para o formulador que se disponha corajosamente a planejar políticas focais de intervenção efetiva na realidade.

Como é possível perceber, os indicadores existem para auxiliar no acompanhamento e análise, devendo servir como ferramenta àquele que se dispõe a realizar estes procedimentos e não, como pensam alguns, como grilhões dos administradores.

O que chamaremos de políticas públicas transparentes devem conter, pelo menos, três indicadores básicos (Belloni et al., 2001; Arretche, 2001 y Faria, 2001): eficácia, eficiência e efetividade, aos quais reunimos os indicadores de impacto e indicadores-sentinelas, também conhecidos como eventos-sentinelas:

  • Impacto: é o indicador que permite o primeiro grande resultado quando explicita como seria ou será o cenário com e sem a Política Pública indicada. A pergunta orientadora é: O que muda se realizarmos tal ou qual projeto? Ou Como será nossa vida com essa nova Política Pública?
  • Eficácia: é o indicador que representa o grau de atingimento dos resultados esperados por uma Política Pública. É o tipo de indicador mais comuns nos programas pela facilidade de identificação de resultado a baixo custo. Eficácia é uma dimensão do processo de desenvolvimento e implementação. É fazer a coisa certa. A pergunta orientadora para este indicador é: Quanto do que se esperava foi alcançado?
  • Eficiência: define a relação entre o custo e o benefício apresentados na Política Pública. Está diretamente relacionado com a qualidade e o modo com que são usados os recursos públicos. É fazer certo as coisas. A pergunta orientadora para esse indicador é: Para fazer isso, eu poderia gastar menos?
  • Efetividade: este indicador quer identificar o grau de satisfação do cidadão ou quanto seu direito foi atendido com a implementação da Política Pública. Efetividade é a dimensão dos resultados. É o quanto a sociedade ganhou de verdade. A pergunta orientadora para este indicador é: Essa Política Pública, de fato, alcançou a expectativa da sociedade?
  • Indicador-sentinela ou evento-sentinela: é o indicador, mesmo indireto, que aponta a existência de risco eminente ou que aponta para algo maior que esta por vir. Em geral, ele serve para sinalizar que prioridades estão sob ameaça. São exemplos de eventos sentinelas: o limite imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal para gasto com pessoal é de 54% da Receita Corrente Líquida mas quando a referida despesa alcança a marca de 51,3% (95%  do limite), iniciam-se as limitações de gasto, sinalizando o risco que se aproxima; outros exemplos clássicos no campo da saúde são as mortes de crianças menores de 1 ano e a morte de mães (pós–parto), indicando que algo existe como provocador dos óbitos e que merece ser investigado a fim de evitar problemas maiores, bem como um único e exclusivo caso de doenças erradicadas (varíola ou pólio). A pergunta orientadora aqui pode ser: o que está por trás deste número e qual o risco dele aumentar?

Vejamos como podemos exemplificar o uso e a diferença dos indicadores. Recorramos a Arretche (2001):

Um programa de vacinação pode ser muito bem-sucedido, em termos de sua eficácia, vale dizer, da possibilidade de efetivamente atingir uma quantidade satisfatória de suas metas de vacinação, por exemplo, vacinar x crianças em um prazo dado. Neste sentido, o programa foi bem-sucedido do ponto de vista da efetiva produção de determinado produto. Isso não significa necessariamente que o programa seja bem-sucedido do ponto de vista dos resultados dele esperados, vale dizer, da possibilidade de efetivamente reduzir a incidência da doença que se propunha a erradicar ou a diminuir substancialmente num horizonte x de tempo.
Da mesma forma, espera-se que programas de saneamento básico, tenham impacto sobre as condições de saúde da população. Ora, uma coisa é abastecer a população com sistemas de água e esgoto e, neste sentido, fornecer produtos como torneira de água e sistema de eliminação de dejetos. Outra bastante distinta é a qualidade deste serviço e, mais distinta ainda, seu impacto sobre as condições de saúde da população (p.32)

A importância do indicador educacional é realçada na apresentação de Corvalan (2002), na I Reunião do Fórum Hemisférico de Avaliação Educacional, onde expõe as seguintes conclusões:

  • Os indicadores educacionais são ferramentas para conhecer nossa situação, e tem a função de dar conta do progresso e das dificuldades. Servem para gestão educacional.
  • Necessitamos de indicadores que computem diferentes níveis de agregação de dados: isto permite conhecer as disparidades e a falta de equidade e orientar a gestão em níveis regional e, especialmente, escolar.

Souza (2005), Carnoy y Loeb (2004) e Corvalan (1996, 1998, 1999) possuem ainda outros trabalhos interessantes que contam a história, indicam e refletem sobre o uso dos indicadores em educação.
            Os indicadores educacionais, como instrumento de comparação internacional e de orientação de decisões de políticas educacionais e gestão escolar, são largamente difundidos na comunidade internacional, tendo como exemplo os projetos transnacionais tais como: o Laboratório Latinoamericano de Avaliação da Qualidade da Educação/LLECE{3}, o Programa Mundial de Indicadores Educacionais/WEI{4} e o Projeto Regional de Indicadores Educacionais/PRIE{5}.

Os autores são bastante imaginativos quando tratam dos possíveis indicadores educacionais mas, com certeza, um longo, amplo e detalhado estudo foi realizado pelo PREI (2001) envolvendo 34 países do Cumbre das Américas e mais 8 do Caribe, que reproduzimos a seguir para que se tenha idéia das possibilidades de produção e as possíveis conseqüências na melhoria da qualidade do planejamento e gestão, bem como a contribuição para a melhor formulação de políticas públicas dirigidas à execução de direitos dos cidadãos:

A partir de este modelo de relaciones se derivan cinco grandes categorías de análisis. Estas categorías y sus indicadores buscan dar respuesta a importantes interrogantes que surgen en el proceso de análisis y toma de decisiones de política educativa, tales como: ¿Cuál es el contexto en el que se desarrolla el sistema educativo? ¿Se atiende efectivamente a la población en edad  escolar? ¿Es eficiente el proceso educativo, asegurando que todos participen de sus beneficios? ¿Son los humanos, materiales y financieros suficientes y de calidad adecuada a las necesidades del sistema? ¿Se está logrando una educación de calidad para todos? ¿Cuál es el impacto social de la educación? Las categorías de análisis a las que corresponden los indicadores inicialmente seleccionados por los países en esta primera fase del PRIE son las siguientes.

2.1. Categoría 1: Contexto demográfico, social y económico

Los indicadores de esta categoría muestran una visión general del contexto en el cual se desenvuelve la educación.
1. Población total, por grupos de edad (en miles)
2. Tasas de crecimiento demográfico 1990-1995; 1995-2000; 2000-2005
3. Distribución de la población según área de residencia
4. Indice de dependencia demográfica
5. Demanda potencial por niveles educativos
6. PIB per capita en dólares PPA
7. Coeficiente de Desigualdad (Coeficiente de Gini)

2.2. Categoría 2: Descripción general y desempeño de los sistemas educativos

Los indicadores de esta categoría muestran un panorama global de la organización de los sistemas educativos nacionales, la duración y articulación de éstos y las características distintivas de cada sistema. Entrega además información sobre los alcances del sistema educacional, es decir, sobre el acceso y la participación de la población en la educación, así como indicadores relativos a la eficiencia del sistema.
1. Obligatoriedad escolar (rangos de edad)
2. Horas en una semana escolar
    Horas en un año escolar
3. Tasa bruta de ingreso a primer grado de educación primaria
    Tasa neta de ingreso a primer grado de educación primaria
4. Tasa bruta de matrícula por nivel educativo y sexo
    Tasa neta de matrícula por nivel educativo y sexo
5. Tasa específica de escolarización por edades simples
6. Porcentaje de repetición

2.3. Categoría 3: Recursos en educación

Los indicadores que comprende esta categoría permiten dimensionar la disponibilidad, características generales, así como la distribución de los recursos humanos y financieros que contribuyen al proceso educativo.
1. Alumnos por docente de aula según nivel educativo
2. Gasto público en educación como porcentaje del PIB
    Gasto público en educación como porcentaje del gasto público total
    Gasto público corriente en educación como porcentaje del gasto público en educación
3. Gasto público en educación por niveles educativos
4. Gasto público en educación por alumno como porcentaje del PIB per capita
    Gasto público en educación por alumno en dólares PPA
5. Gasto privado en educación como porcentaje del PIB
    Gasto total en educación como porcentaje del PIB
6. Salario inicial docente (Sector Público) por nivel educativo como porcentaje del  PIB per capita
      Salario inicial docente (Sector Público) por nivel educativo en dólares PPA
7. Evolución del salario profesor (Sector Público) con formación mínima según nivel

2.4. Categoría 4: Calidad de la educación

Se considera en esta categoría el logro académico expresado como resultados de pruebas estandarizadas y comparables. Sin embargo, aún no existen indicadores internacionalmente comparables para toda la región en esta categoría.

2.5. Categoría 5: Impacto social de la educación

Esta categoría incluye indicadores relativos al impacto de la educación más allá del sistema educativo, es decir, el perfil educativo y el nivel de analfabetismo de la población adulta. El desarrollo de otros indicadores en esta categoría que vinculen, por ejemplo, la educación com el mercado laboral y la calidad de vida en su concepción más amplia, es aún incipiente en la región siendo el propósito de un estudio especifico abordado por el PRIE.

  • Tasa de analfabetismo adulto
  • Perfil educativo de la población adulta
  • Población de 25- 29 años con 10 o más de escolaridad según área de residencia
  • Años de escolaridad de la población de 25 años según nivel de ingreso y desigualdad educativa

Como é possível perceber, existe uma infinidade de indicadores que podem e devem ser aplicados à educação e ao ensino. Mas, se por um lado, os indicadores podem servir (1) de balizadores para as decisões de políticas, (2) orientadores de planejamento, (3) de parâmetros para a avaliação de sistemas e de escolas e (4) para comparabilidade entre níveis e séries históricas, pouco contribui para informar aos profissionais não-especializados no ofício da gestão educacional e, muito menos, para orientar o cidadão na análise de cumprimento pelo poder público de seus direitos estabelecidos em lei —primeira preocupação para políticas públicas.

Fernando Rosseti, em sua coluna do Portal Aprendiz{6}, de 06/05/2003, comenta a manchete estampada na Folha de São Paulo: “Para o MEC, aprendizagem é uma ‘tragédia’”, a partir de re-análise de dados existentes no INEP pelo recém eleito governo Lula. O dado estatístico, o índice e o indicador podem servir para a comunidade tal qual o boletim escolar serve para as famílias: um termômetro para aferir a “saúde” do estudante. Mas o dado estatístico, o índice e o indicador podem ser manipulados pelo juízo de valor e pela necessidade comum dos governantes de mostrar serviço e de denunciar equívocos, erros ou fragilidades nos processos encontrados na administração do antecessor. Dirá Rosseti:

A questão é que essas estatísticas podem, e muito provavelmente irão, voltar como bumerangue contra aqueles que as disseminam com tanta verve. Não se mudam significativamente os resultados médios dos estudantes em português ou matemática em quatro anos, nem mesmo em oito, especialmente numa fase de tamanha expansão no atendimento. A ideologização dos dados (e é importante ressaltar que isso também ocorria com o PSDB, mas servindo a outras políticas) está no fato de que, estranhamente, não foram divulgadas séries históricas. Estas sim permitem uma leitura melhor da evolução da educação. (...) No lugar de mostrar um filme, o INEP gestão PT preferiu mostrar fotografias.

Daí a necessidade de se estabelecer correlações de dados que possam ser encaradas como padrões de consenso para temas tidos como fundamentais pela comunidade acadêmica e pela sociedade que, ao fim e ao cabo, paga as contas do Governo.

Até aqui mostramos a importância dos indicadores como dados que permitam observar realidades e melhor entender o cenário educacional. Em contra partida, mostramos que estes indicadores são numerosos, cobrem um sem número de variáveis, com importância variada para cada segmento educacional e/ou social e podem sofrer a ação ideológica e de marketing por governos ávidos por afirmação frente à comunidade. Torna-se importante, então, que haja um consenso sobre um conjunto de indicadores de satisfação social e que exista um sistema de indicadores que antecipe possíveis dificuldades, a fim de que possamos estar preparados na busca pela educação de qualidade. Este sistema de indicadores, pequeno e prioritário, que antecipa situações perigosas para a sociedade é chamado de sistema sentinela, que tem como menor célula o chamado evento sentinela.

3. O sistema sentinela

Os chamados eventos sentinelas são acontecimentos, de notificação obrigatória, que permitem vislumbrar falha em procedimentos estabelecidos ou mesmo quebra de qualidade em fator tido como importante. O evento sentinela, como fonte de notificação especializada, inicia uma série de ações previamente ajustadas, de modo a sinalizar a falha no sistema, permitindo que haja ação corretiva e impedindo que o problema se alastre.

Encontramos o uso geral da idéia de sistema sentinela em diversos espaços. Léo Lince{7} escreverá que

O assassinato do prefeito Celso Daniel, como um evento sentinela que faz transbordar todas as medidas, colocou a cidadania brasileira "de frente pro crime". Todos viram "o corpo estendido no chão": um homem do bem trucidado pelas forças do mal. A comoção generalizada se irradia do ato brutal, mas só se consolida na constatação de que, no Brasil de hoje, as forças do mal operam com cada vez mais desenvoltura. Essa é a questão fundamental que define a natureza política do atentado. (realce nosso).

Outra notícia que utiliza o conceito é a que envolve a apuração paralela das eleições e diz o seguinte{8}:

No dia da votação paralela, os técnicos do TRE, com a anuência do Juiz que presidiu o evento, do representante do Ministério Público e do representante da OAB, tentaram alternar a votação das duas urnas para o ritmo não ser constante, mas ao final, o próprio índice de abstenção (132 votos para 413 eleitores) foi um relevante evento sentinela indicador de situação de teste. A postura dos fiscais do PT foi a de quem estava fiscalizando os fiscais dos demais partidos e não o processo (grifo nosso)

O conceito de sistema sentinela e seus desdobramentos (indicadores sentinelas, evento sentinelas, profissionais sentinelas e escolas sentinelas) são utilizados de forma bastante eficiente no campo da saúde, de onde transpomos os conceitos e base teórica para melhor entendimento do que seja e como se comporta o sistema sentinela e seus formadores.

Na área de saúde ocupacional{9}, um evento sentinela pode ser entendido como uma doença, acidente, incapacidade, morte prematura etc, cuja ocorrência poderia ser utilizada para estudos e servir como sinal de alerta para a necessidade de substituição de materiais, rotinas técnicas e de trabalho visando proteção pessoal em vários níveis.

Ao se referir a um projeto de prevenção de quedas de idosos, a Associação Médica Brasileira{10} e Conselho Federal de Medicina informam que a queda pode indicar um evento sentinela na vida de uma pessoa idosa, sendo um marcador potencial do início de um importante declínio da função ou mesmo um sintoma de uma patologia nova.

A comunidade de Angiologia e Cirurgia Vascular (SBACV, 2001) conceitua o evento sentinela como sendo aquele representativo da morbidade. De fácil mensuração e com registros confiáveis, deve ser vulnerável às ações de controle, detectando de forma sensível e precoce, as mudanças ocorridas, permitindo um acompanhamento da tendência, que antecipará decisões.

4. Os Sistemas Sentinela em Educação

Desenvolvida a idéia de sistema sentinela e apresentadas as hipóteses efetivas de utilização destes conceitos nas áreas da saúde, podemos tentar aplicar analogamente esta idéia no campo educacional. Quando propomos a aplicação de indicadores que permitam a antecipação decisória, evitando o agravamento do problema, sabemos da dificuldade de se pensar o futuro, de se desenhar cenários futuros possíveis, de se estender a visão política além do horizonte restrito do curto prazo do gestor em seu posto. Defendemos a necessidade de se criar a cultura da visão de futuro e o exercício de formulação de cenários como orientadores da decisão política (Chrispino, 2001 e 2003), sendo o indicador sentinela uma ferramenta fundamental.

Quando apresentamos o conceito de sistema sentinela, temos em mente que sejam eleitos indicadores chaves cujo movimento, para mais ou para menos, para maior ou para menor, mais rápido ou mais lento, possam ser encarados como eventos sentinelas de notificação imediata pelas escolas sentinelas, escolhidas como representativas da rede a que pertencem. A Tabela 4 propõe uma analogia para o sistema sentinela na Educação.

Tabela 4.

Conceitos sentinela em educação

Sistema Sentinela

Esta estratégia de formação de Sistemas Sentinela tem como objetivo monitorar indicadores chaves na população geral ou em grupos especiais, que sirvam como alerta antecipado para o sistema, não tendo a preocupação com estimativas precisas de incidência ou prevalência da população geral, mas o início de um processo de reparação e de antecipação de medidas capazes de minorar o evento percebido.

Escolas sentinelas

Organização de redes constituídas de escolas para notificação especializadas, representativas dos sistemas e capacitadas a informar acontecimentos e alterações dos indicadores chaves que possam significar mudanças no sistema como um todo e, suficientemente motivadas para participar de esforços colaborativos comuns, voltados ao estudo de problemas  de gestão e aprendizado.

Evento sentinela

Evento sentinela é a detecção de uma alteração nos índices e/ou dados, cuja ocorrência serve como um sinal de alerta de que a qualidade do sistema deve ser questionada. Assim, toda vez que se detecta evento desta natureza, o sistema sentinela provoca as medidas indicadas  para que o problema não cresça ou seja somente percebido quando as análises técnicas apuradas informem o fato muito tempo depois .

Vigilância de áreas sentinelas

É a delimitação de áreas geográficas específicas para se monitorar a ocorrência de fenômenos em estudo e acompanhamento e de indicadores chaves específicos e particulares para uma dada região.

O uso do Sistema Sentinela apresenta algumas vantagens. Primeiro que os indicadores chaves, que serão monitorados para registro nos eventos sentinelas, serão indicadores de consenso social. Isto é, não deve surgir da cabeça de um dirigente mas de discussões coletivas. Segundo, trará embutido um conceito de alteração significativa esperada ou mesmo de surgimento esperado, permitindo que toda alteração inesperada ou surgimento despropositado seja alertado pelas escolas sentinelas. Terceiro, permitirá uma integração dos componentes das redes, uma vez que a identificação representativa do sistema de ensino apontando uma e/ou outra escola só funcionará se houver sinergia entre os pontos (escolas sentinela).

Para que o sistema sentinela em educação seja efetivo, é necessário que se discuta e conclua (1) o que é prioritário em educação e, a isso chamaremos de indicadores chaves; (2) a que tempo devemos submeter os índices e as alterações desses mesmos índices; (3) que episódios novos e que alterações dos índices conhecidos caracterizam alterações significativas para caracterizar um evento sentinela; (4) que áreas sentinelas serão demarcadas e que indicadores especiais serão selecionados.
Uma coisa é certa, os eventos sentinelas precisam existir em número reduzido pois “onde tudo é prioritário nada é importante” já anuncia o adágio popular e o interesse norteador da escolha e da metodologia deve ser o valor social, o impacto na educação e no ensino, sob a ótica dos estudantes, que são o principal motivo de existir do sistema educacional e da própria escola.

A aplicação do conceito de sistema sentinela precisa ser encarado como técnica que tem a função precípua de facilitar a realização de uma tarefa por meio de otimização do tempo e/ou diminuição do esforço/energia despendida, ou mesmo melhorar a qualidade do resultado final. O conceito de indicador sentinela pode ser a conexão do saber técnico, do fazer político e a necessidade social. Mas para que tal ocorra, não é possível que se tenha uma longa lista de prioridades – na mais das vezes distintas – para cada um dos segmentos envolvidos. Antes, devem estes segmentos identificar o futuro que se deseja (saber técnico), que se pode realizar (capacidade político-administrativa) e que se sonha (necessidade social). Os indicadores sentinelas devem balizar se o sistema e a escola estão caminhando na direção desejada, possível e sonhada.

A guisa de exemplo elementar, poderemos ter como orientador do Sistema Sentinela a progressão/reversão de taxas educacionais{11}, com a expectativa de que o indicador sentinela seja sempre igual ou maior do que 1 (um) e, por fim, que seja considerado evento sentinela o indicador que seja menor do que um nos seguinte norteadores:

Tabela 5. Definição de evento sentinela e de indicador sentinela


Evento
Sentinela

Relação entre as taxas-escolhidas dos anos subseqüentes (1998-2000) sejam menores do que 1, se  a expectativa é o aumento da taxa (ordem direta = final/inicial)

Relação entre as taxas-escolhidas dos anos subseqüentes (1998-2000) sejam menores do que 1, se  a expectativa é a diminuição da taxa (ordem reversa = inicial/final)

Indicadores
Sentinelas

Ordem direta: Taxa de função docente com formação superior – Ensino Fundamental; Taxa de função docente com formação superior – Ensino Médio; Taxa de aprovação – Ensino Fundamental; Taxa de distorção idade/série – Ensino  Fundamental; Taxa de aprovação – Ensino Médio.

Ordem reversa: Taxa de reprovação  – Ensino Fundamental e Taxa de abandono – Ensino Médio

Tabela 6. Sistema sentinela: indicador sentinela por ordem direta


Taxas (devem ser progressivas)

1

2

2/1

classificação

1998

2000

Indicador sentinela

Taxa de função docente  com formação superior – Ensino Fundamental

46,2

48,3

1,045

conforme o esperado

Taxa de função docente  com formação superior – Ensino Médio

89,3

88,5

0,991

evento sentinela

Taxa de aprovação – Ensino Fundamental

78,3

77,3

0,987

evento sentinela

Taxa de aprovação – Ensino Médio

78,5

75,9

0,967

evento sentinela

Tabela 7. Sistema sentinela:  indicador sentinela por ordem reversa

Taxas (devem ser regressivas)

1

2

½

classificação

1998

2000

Indicador
sentinela

Taxa de reprovação  – Ensino Fundamental

9,7

10,7

0,906

evento sentinela

Taxa de distorção idade/série – Ensino  Fundamental

47,2

41,7

1,132

conforme o
esperado

Taxa de abandono – Ensino Médio

15,2

16,6

0,916

evento sentinela

Pela proposta que defendemos, se estas fossem as taxas escolhidas como indicadores-sentinela, as escolas selecionadas (escolas-sentinelas) para formarem uma rede representativa do universo escolar deveriam notificar cinco eventos-sentinela, visto que apenas duas taxas se comportaram como o esperado.

A leitura da taxa isoladamente pode distorcer a realidade e servir a propósitos não explicitados, mas quando correlacionada com o indicador sentinela ela será vista e analisada no contexto, tornando-se menos suscetível a manipulações política.

Com certeza, esta proposta não é nova nem recente, a preocupação em antecipar indicadores, ou ficar de sentinela, é bastante antiga como conta Schwartz  (2000):

Na época em que os faraós governavam o Egito, havia um templo acima do rio Nilo, além das cataratas da Núbia, onde agora se localizam os desertos ao norte do Sudão. Três rios juntavam-se naquela região para formar o Nilo, que fluía 1.600 quilômetros para produzir um evento milagroso todos os anos, a inundação de sua bacia, que permitias aos fazendeiros egípcios plantar e colher no verão sem chuvas.

A cada primavera os sacerdotes se reuniam à margem do rio para verificar a cor da água. Se estivesse clara, o Nilo Branco, que fluía do lago Vitória através dos pântanos sudaneses, dominaria a enchente. A cheia seria moderada e tardia; os fazendeiros produziriam um mínimo de colheita. Se a corrente aparecesse escura, as águas fortes do Nilo Azul, que se juntava ao Nilo Branco em Cartum, prevaleceriam. A enchente encharcaria o suficiente para saturar os campos e produzir uma colheita farta. Finalmente, se a correnteza demonstrasse predominância das águas marrom-esverdeadas do Atbara, que vinha dos pântanos etíopes, então as enchentes seriam prematuras e catastroficamente elevadas. As plantações corriam o risco de ser destruídas pelas águas; na verdade, o faraó poderia ter que usar suas reservas de estoques de grãos.

Todos os anos os sacerdotes enviavam mensageiros para informar ao faraó a cor da água. Talvez tenham usado luzes e sinais de fumaça para mandar notícia rio abaixo. Então o faraó saberia quão prósperos seriam os fazendeiros de seus reino e como poderia aumentar os impostos. Dessa forma, saberia se podia permitir-se conquistar novos territórios. (...) os sacerdotes do Nilo sudanês foram os primeiros previsores do futuro a longo prazo.

 

Referencias bibliográficas

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{1} Desenvolvimento Humano e Condições de Vida: Indicadores Brasileiros. PNUD, IPEA, IBGE, Fundação João Pinheiro. Brasília: 1998

{2} O Globo, 08.06.2003, p. 15, “No Governo, PT encolhe os pobres”, de Carter Anderson.

{3} http://llece.unesco.cl

{4} World Educacional Indicators/UNESCO Institute for Statistics, www.uis.unesco.org

{5}http:// www.prie.cl

{6} http://www1.folha.uol.com.br/folha/aprendiz/

{7} http://www.correiocidadania.com.br/ed281/politica4.htm, de frente pro crime,  em 29.06.2003

{8} http://www.mail-archive.com/voto-eletronico@pipeline.iron.com.br/ msg11950.html,  em 29.06.2003

{9} http://geocities.yahoo.com.br/msquim2001/estudos_segur

{10} http://www.amb.org.br/projeto_diretrizes/quedas_idosos

{11} INEP. A educação no Brasil na década de 90: 1991/2000, Brasília: INEP/MEC, 2003.